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Mensagem: Saudosa Praça da Matriz Ruth Tupinambá Graça A antiga Praça da Matriz hoje Dr. Chaves, é muito importante para nós montesclarenses. Foi ali a nossa cidade começou. O valente bandeirante este paulista de nervos de aço, obstinado e corajoso, que deixando família e o conforto das grandes cidades, se embrenhou na vastidão do sertão enfrentando perigos, cortando extensos chapadões, atravessando densas matas, abrindo estradas, criando povoados, escutando apenas o pio triste do “Zabelê” e do “Fogo Pagou”, naquele deserto infindo deixando por onde passava, o seu rastro de gente, onde só existiam feras. Aqui ele edificou a Fazenda dos Montes Claros das Formigas ( Sesmaria ganha por merecimento) cuja sede a primeira casa da nossa cidade, infelizmente hoje demolida. Nesta Fazenda ele viveu muitos anos beneficiando nossa terra, fazendo contato com centros mais civilizados. Mais tarde cansado velho e doente resolveu voltar a sua terra natal se dispôs a vendê-la ao Alferes José Lopes de Carvalho, seu segundo proprietário. Este homem simples mas inteligente e extremamente católico, espírito empreendedor teve idéia de construir uma capela em frente sua fazenda para assistir com sua família e fazendeiros vizinhos, os sacramentos: missa, procissões, batizados e casamentos. Esta Capela cuja licença foi conseguida com muito sacrifício foi a” célula Vital” onde tudo começou. Á sua volta foram se agrupando primeiras casas dos fazendeiros vizinhos. Eram simples, num colonial sem luxo, agarradas umas ás outras como se estivessem cochichando. Com o passar dos anos cresceu o numero de moradores e este povoado se transformou em Arraial e depois, Vila de Montes Claros das Formigas. José Lopes de Carvalho foi durante muitos anos chefe deste “Formigueiro Humano”, lutando bravamente conseguindo vencer obstáculos que á primeira vista pareciam impossíveis. Novos fazendeiros foram se deslocando das pequenas cidades vizinhas, atraídas pelas noticias de suas riquezas naturais, clima e terreno excelentes para agricultura e criação de gado, em fim um lugar para ter uma vida saudável e se enriquecer. E aquele “Formigueiro Humano” se explodiu para todos os lados procurando recursos para tornar-se independente. E o milagre aconteceu em 3 de Julho de 1857 a Vila de Montes Claros das Formigas foi despertada , na madrugada, pela “alvorada” com a Banda de Música Euterpe Montesclarense, criada em 1856 pela grande mulher Dona Eva Barbosa Teixeira de Carvalho, mulher dinâmica , batalhadora incansável pelo progresso de Montes Claros. A população eufórica estourava foguetes e delirava com a vitória: estava criada a cidade de Montes Claros. Durante anos ela foi uma cidade simples e apesar da sua beleza e riquezas naturais , foi por muito tempo esquecida pelos nossos governantes, perdida neste enorme sertão das Gerais, longe da civilização, sem transporte e comunicação. Era quase escura mais em compensação, um céu lindo que só Montes Claros possui (desculpe o bairrismo)a noite a lua surgia rodeada de estrelas clareando toda aquela extensão tranqüila e não faltavam seresteiros para saudá-la com um violão choroso. Montes Claros era uma só família de autênticos mineiros. Sua gente era simples mesmo nas tradicionais famílias ricas as senhoras eram distintas mas modestamente vestidas. Os menos afortunados não se sentiam humilhados porque pobres e ricos brincavam juntos e se misturavam nas escolas públicas. As crianças tinham infância (na extensão da palavra) eram livres e felizes. Nadavam (o rio Vieira não era poluído) nas águas puras e cristalinas, pegavam piabas em peneirinhas, trepavam nas arvores, andavam á cavalo em pêlo, jogavam peladas, acompanhavam os Palhaços nas ruas, (quando surgiam circos na cidade) eufóricos com uma grande cruz de tinta preta na testa, passaporte para entrar gratuitamente nos espetáculos. Eu tive oportunidade de passar minha infância, nesta cidade pacata e a Praça da Matriz, hoje Dr. Chaves, onde morei durante muitos anos, era o meu “castelo” e paraíso dos brinquedos .A Praça era quase escura sem Calçamento onde a poeira fofa cobria nossos pés descalços quando a noite reuníamos brincando despreocupadamente (não existiam ladrões nem drogados e assaltantes na nossa cidade) de Boca de Forno”, Veadinho quer Mel”, Chicotinho Queimado”), correndo em volta daquela Praça imensa. Enquanto brincávamos, dando azas as nossas energias, nossas famílias visitavam suas comadres e assentadas comodamente em cadeiras de palhinha (moda na época) habilmente colocadas em circulo na porta da rua. Não existiam automóveis, este circulo poderia prolongar-se dependendo do numero de visitas. Era de praxe servir o café ali mesmo, por sinal muito gostoso, torrado em casa, com biscoitos e rocas, pão de queijo, tudo quentinho. Nisto a dona da casa se aprimorava em oferecer o melhor para, com um doce sorriso, receber os elogios das visitas. Esta mesma Praça era muito respeitada e até reverenciada (o que não acontece hoje) importante centro de todas as festividades religiosas, palco de todos os acontecimentos políticos e sociais da nossa terra. Hoje mais de 70 anos decorridos eu passo em frente esta Praça Dr. Chaves e fico pensando na antiga Praça da Matriz, em tudo que ali vivi e as lembranças me vêm a mente com aquela saudade que machuca e ao mesmo tempo nos conforta. Foi um tempo feliz, onde realizei todos os meus sonhos de criança. Jamais esquecerei das novenas do mês de Maio que com tanta alegria eu subia ao altar ,vestida de anjo, coroando Nossa Senhora e cobri-la com pétalas de rosas que eu carregava com todo cuidado numa cestinha de filó. E os leilões, após a novena, onde a criançada espreitava aquela mesa cheia de doces e frutas sob o olhar vigilante do leiloeiro. As “retretas” no Coreto da Praça quando a Banda Euterpe Montesclarense aos domingos alegrava aquela Praça com os mais belos dobrados. As Festas de Agosto com os belos “Reinados” desfilando acompanhados pelos catopés, marujos e caboclinhos. E as “cavalhadas”, representando as lutas entre mouros e cristãos, dos tempos medievais e que hoje não existe mais nas Festas de Agosto. Era um espetáculo maravilhoso. Meu pai tomou parte, muitas vezes e era o Rei Cristão. Eu me sentia orgulhosa ao vê-lo montado num fogoso cavalo correndo elegantemente em toda aquela Praça, enquanto sua capa de veludo azul volteava no ar ao som da música que executava uma bonita valsa. É assim. O tempo passa se vai, mas não desaparece... ele sempre permanece e volta com sua força para nos lembrar o que fomos, o que somos e o que seremos. (N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).
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